O nome científico da doença de Chagas é Tripanossomíase americana ou brasileira. É uma doença infecciosa causada por um protozoário parasita chamado Trypanosoma cruzi, nome dado por seu descobridor, em 1909, o cientista brasileiro Carlos Chagas, em homenagem a outro cientista, também, brasileiro, Oswaldo Cruz. A doença atinge cerca de 18 milhões de pessoas no mundo, sendo 6 milhões no Brasil. A doença pode cursar com comprometimento cardíaco, a chamada cardiopatia chagásica crônica. Além do coração e dos músculos, o parasita causa lesões também no fígado, no sistema nervoso (encefalites, mielites, etc.), e nos gânglios linfáticos.
 
 
 
 
 
 
 
Quem são os transmissores da Doença de Chagas?
O maior transmissor da doença de chagas no Brasil tem um nome pomposo: Triatoma, mas é vulgarmente conhecido por várias alcunhas, como bicho-de-parede, bicho-de-frade, gaudério, procotó, rondão, chupança e barbeiro.
Uma descrição sucinta do Triatoma diria que é um inseto com aproximadamente 2 centímetros de comprimento, asas achatadas, largas e listradas nas bordas, não muito diferente de uma barata doméstica comum, mas com um ferrão comprido. Ao contrário da barata, porém, é hematófago, ou seja, alimenta-se de sangue.
Estudos revelam a existência de pelo menos 31 espécies diferentes de "barbeiros" (triatomíneos) parasitados pelo Trypanossoma.
As espécies infectadas encontradas no Brasil mais importantes são: Triatoma infestans, T. brasiliensis, Panstrongylus megistus, T. sordida, T. pseudomaculata. Na Região Amazônica, 18 espécies são incriminadas como importantes vetoras (transmissoras da doença).
 
Como se transmite a Doença de Chagas?
Através da entrada do Trypanosoma no sangue dos humanos a partir do ferimento da “picada” por triatomas, os populares barbeiros ou chupões, entre outros nomes.
Estes triatomas, ou barbeiros, alimentam-se de sangue e contaminam-se com o parasita quando sugam sangue de animais mamíferos infectados, que são os reservatórios naturais (bovinos, por exemplo) ou mesmo outros humanos contaminados. Uma vez no tubo digestivo do barbeiro, o parasita é eliminado nas fezes junto ao ponto da “picada” (ato da alimentação do inseto), ou seja, assim que o barbeiro termina de se alimentar ele defeca, eliminando protozoários e colocando-os em contato com a ferida e a pele da vítima.
Outras formas de contato ocorrem na vida intra-uterina por meio de gestantes contaminadas, de transfusões sanguíneas ou acidentes com instrumentos de punção em laboratórios por profissionais da saúde, estas duas últimas bem mais raras.
No Brasil, foram registrados casos da infecção transmitida por via oral nas pessoas que tomaram caldo-de-cana ou comeram açaí moído. Embora não se imaginasse que isso pudesse acontecer, o provável é que haja uma invasão ativa do parasita diretamente através do aparelho digestivo nesse tipo de transmissão.
Portanto, os modos de transmissão são:
  • Vetorial: passagem do T. cruzi das excretas de triatomíneos pela pele lesada ou mucosas durante ou logo após o repasto sanguíneo (picada/alimentação/defecação do inseto).
  • Transfusional: infecção por meio de hemoderivados (derivados do sangue), órgãos ou tecidos de doadores contaminados.
  • Vertical: passagem do T. cruzi de mães para seus filhos durante a gestação ou parto.
  • Oral: pela ingestão de alimentos contaminados com T. cruzi. Esta forma é implicada em surtos em diversos estados e na Amazônia brasileira, com letalidade elevada.
  • Acidental: a partir do contato de material contaminado (sangue de doentes, excretas de triatomíneos) com a pele lesada ou mucosas, geralmente durante a manipulação em laboratório, sem equipamento adequado de biossegurança.
Qual o período de incubação e transmissibilidade?
O período de incubação varia com a forma de transmissão: vetorial: 5-15 dias; transfusional: 30-40 dias; vertical: pode ocorrer em qualquer período da gestação ou durante o parto; oral: 3-22 dias. O chagásico pode albergar o T. Cruzi por toda a vida. No entanto, os principais reservatórios são os outros mamíferos já citados.
 
Qual o tipo de transmissão mais frequente?
A forma de transmissão mais importante era a vetorial, nas áreas rurais, responsável por cerca de 80% dos casos hoje considerados crônicos. As medidas de controle vetorial proporcionaram a eliminação da transmissão pela principal espécie vetora (T. infestans). A transmissão transfusional sofreu redução importante com o controle de doadores de sangue e hemoderivados. Nos últimos anos, as formas vertical e oral ganharam importância epidemiológica, sendo responsáveis por grande parte dos casos identificados.
 
Como se manifesta a doença de Chagas?
Pode manifestar-se sob várias formas:
  • Manifestações agudas:
Caindo na circulação, o Trypanosoma cruzi afeta os gânglios, o fígado e o baço. Depois se localiza no coração, intestino e esôfago. Normalmente o quadro clínico da infecção surge de 5 a 14 dias após a transmissão pelo barbeiro e 30 a 40 dias para infecções por transfusão sanguínea, mas as manifestações crônicas da doença de Chagas aparecem mais tarde, na vida adulta. Mais ou menos de 4 a 6 dias após o contato com o barbeiro, pode surgir uma inflamação no local da entrada do parasito. Quando a infecção se dá no olho ou próximo a ele, o olho pode ficar inchado, sinal característico da doença, mas pouco frequente. Quando ocorre na pele dos braços, pernas ou rosto, a lesão inicial pode se assemelhar a um furúnculo ou a uma mancha avermelhada quase sempre dolorosa. Essas lesões iniciais frequentemente são acompanhadas de "ínguas" nas regiões próximas do local de contaminação. A febre é um dos sintomas mais frequentes nessa fase da doença e, às vezes, o único. Trata-se de febre baixa e contínua, geralmente durando semanas.
Alguns dias após a penetração do parasito, vai surgindo um mal-estar, falta de apetite, aceleração dos batimentos cardíacos, aumento do tamanho do baço e fígado, inchaço da face e de todo o corpo, indicando a disseminação da doença para todo o corpo. Esse quadro é mais comum entre as crianças (1 a 5 anos). Em pessoas mais velhas geralmente esses sinais ficam muito atenuados e a fase inicial da doença passa despercebida, confundindo-se com uma gripe ou mal-estar. A fase aguda tende a desaparecer espontaneamente. Porém em certos casos graves, sobretudo em crianças, podem sobrevir à morte devido a um ataque intenso do parasito aos órgãos e tecidos mais nobres do corpo, como coração e o sistema nervoso central (meningite e encefalite).
  • Manifestações crônicas:
Na fase crônica da doença, as manifestações são de doença do músculo do coração, ou seja, batimentos cardíacos descompassados (arritmias), perda da capacidade de “bombeamento” do coração, progressivamente, até causar desmaios, podendo evoluir para arritmias cardíacas fatais. O coração pode aumentar bastante, tornando inviável seu funcionamento. Outras manifestações desta fase podem ser o aumento do esôfago e do intestino grosso, causando dificuldades de deglutição, engasgos e pneumonias por aspiração e constipação crônica e dor abdominal. Essas lesões são definitivas e irreversíveis.
 
Como se faz o diagnóstico da Doença de Chagas?
Através dos sintomas acima descritos e história de contato com o barbeiro (a chamada epidemiologia positiva para a doença de Chagas). Entretanto, para se ter certeza, exames especiais são necessários.
Na fase aguda deve-se procurar o Trypanossoma cruzi no sangue (é o exame microscópico de uma gota de sangue do paciente, para a eventual identificação do Trypanosoma, ou a biopsia de um gânglio linfático) e na fase tardia da doença são necessários outros métodos, as reações sorológicas, já que a quantidade de Trypanossomas no sangue é muito pequena nessa fase.
O diagnóstico deve basear-se em método indireto: verifica se o organismo está produzindo anticorpos contra o Trypanosoma cruzi. Há vários tipos dessas reações, sendo as mais usadas a imunofluorescência para a doença de Chagas, denominada "reação de fixação do complemento para a doença de Chagas" ou "reação de Guerreiro e Machado", ou de "Machado Guerreiro". O diagnóstico da cardiopatia chagásica crônica pode ser feito analisando-se, além do exame clínico, os exames complementares, como o eletrocardiograma, a radiografia do tórax e o ecocardiograma.
 
Onde vivem os transmissores da Doença de Chagas?
Podem viver dentro de sua casa, em volta da sua casa, quintais, canis, etc., ou no meio silvestre.
Além do homem, diversos mamíferos domésticos e silvestres são infectados pelo T. cruzi. Os mais importantes são os que estão próximos do homem (gatos, cães, porcos, ratos). Também são relevantes tatus, gambás, primatas não humanos, morcegos, entre outros animais silvestres. Aves, répteis e anfíbios são imunes à infecção pelo T. Cruzi.
Os insetos transmissores são de hábitos noturnos, vivem nas frestas das casas de pau-a-pique, ninhos de pássaros, tocas de animais, casca de troncos de árvores e embaixo de pedras.
 
Como é realizado o tratamento?
Até agora a doença de Chagas não tem cura cientificamente reconhecida. Enquanto os pesquisadores não descobrem um remédio eficaz, o combate à doença tem que se limitar à sua prevenção. E até agora o método profilático mais prático tem sido o combate sistemático ao "barbeiro". Para isso, equipes especializadas percorrem as regiões infestadas, visitando o maior número possível de casas de barro e pau-a-pique, tratando-as com doses maciças de inseticida. Evidentemente, a doença de Chagas é, além da moléstia terrível, consequência da miséria social, porque ataca, sobretudo, as camadas mais desamparadas da população, aquelas que por sua pobreza são obrigados a viver em choças, em condições subumanas e os trabalhadores rurais por estarem em contato direto com o meio silvestre.
Mas nem tudo deve ser encarado com pessimismo. O alarma contra a doença de Chagas já encontrou eco em todas as partes do mundo. Novos medicamentos estão em observação, alguns com resultados mais positivos na forma aguda da moléstia.
O tratamento específico deve ser realizado o mais precocemente possível nas formas aguda ou congênita, e na forma crônica recente (crianças menores de 12 anos). A droga disponível no Brasil é o benznidazol. É contra indicado em gestantes. A medicação é dada sob acompanhamento médico nos hospitais devido aos efeitos colaterais que provoca, e deve ser mantida, no mínimo, por um mês. O efeito do medicamento costuma ser satisfatório na fase aguda da doença, enquanto o parasita está circulando no sangue. Na fase crônica, não compensa utilizá-lo mais e o tratamento é direcionado às manifestações da doença a fim de controlar os sintomas e evitar as complicações.
O tratamento sintomático depende das manifestações clínicas, tanto na fase aguda como na crônica. O tratamento da cardiopatia chagásica crônica volta-se ao combate dos sintomas da insuficiência cardíaca, arritmias cardíacas, prevenção da morte súbita e da formação de coágulo dentro do coração. Para tal, dispomos de medicamentos (inibidores da enzima de conversão, betabloqueadores, diuréticos, anticoagulantes, antiarrítmicos, como a amiodarona e, outros), marcapasso artificial e desfibrilador automático implantável. Em alguns casos, poderá ser indicado um transplante de coração.
 
Quais são as medidas de prevenção e de controle no combate aos vetores?
As medidas de prevenção e de controle no combate aos vetores podem ser:
  • Transmissão vetorial: controle químico de vetores com inseticidas quando a investigação entomológica (de insetos) indicar a presença de triatomíneos domiciliados; melhoria habitacional em áreas de alto risco suscetíveis a ambientes domiciliares.
  • Transmissão transfusional: manutenção do controle de qualidade rigoroso de hemoderivados.
  • Transmissão vertical: identificação de gestantes chagásicas na assistência pré-natal ou de recém-nascidos por triagem neonatal para tratamento precoce.
  • Transmissão oral: cuidados de higiene na produção e manipulação artesanal de alimentos de origem vegetal.
  • Transmissão acidental: utilização de equipamento de biossegurança para os trabalhadores, principalmente em ambiente rurais.
Que outros perigos estão relacionados com a doença?
  • A associação de doença de Chagas com AIDS ou outros estados de imunossupressão tem mostrado formas de reagudização (reaparecimento de dores ou sintomas) grave que se desconhecia até então, como o desenvolvimento de quadros neurológicos relacionados à inflamação das camadas que revestem o cérebro (meningite).
  • Em crianças nascidas de mães com exame positivo para T. Cruzi pode haver prematuridade, baixo peso, hepatoesplenomegalia (aumento do tamanho do fígado e do baço), icterícia (coloração amarelada da pele e mucosas), equimoses e convulsões por hipoglicemia; meningoencefalite (processo inflamatório que envolve o cérebro e meninges) costuma ser letal.
  • Como nem sempre os sintomas são perceptíveis, o indivíduo pode saber que tem a doença, 20, 30 anos depois de ter sido infectado, ao fazer um exame de sangue de rotina. O pior de tudo é que a doença se introduz de maneira insidiosa nos seres humanos.
  • A doença de Chagas pode não provocar lesões importantes em pessoas que apresentem resposta imunológica adequada, mas pode ser fatal para outras.
  • Não existe vacina contra a doença de Chagas, e a melhor maneira de enfrentá-la se dá por meio da prevenção e do controle, combatendo sistematicamente os vetores.
Em resumo, quais são as recomendações?
  • Combater sistematicamente os vetores, mediante o emprego de inseticidas eficazes;
  • Construção ou melhoria das habitações de maneira a torná-las pouco próprias à proliferação dos triatomíneos;
  • Eliminação dos animais domésticos infectados;
  • Uso de cortinados nas casas infestadas pelos vetores, controle e descarte do sangue contaminado pelo parasita e seus derivados;
  • Os cuidados devem ser redobrados nas regiões onde o barbeiro ainda existe, por exemplo, o Vale do Jequitinhonha, no norte de Minas Gerais, e em algumas áreas do nordeste da Bahia;
  • Pessoa que esteve numa região de transmissão natural do parasita deve procurar assistência médica se apresentar febre ou qualquer outro sintoma característico da doença de Chagas;
  • Portadores do parasita, mesmo que sejam assintomáticos, não podem doar sangue;
  • A cana-de-açúcar deve ser cuidadosamente lavada antes da moagem e a mesma precaução deve ser tomada antes de o açaí ser preparado para consumo;
  • Eliminar o inseto transmissor da doença ou mantê-lo afastado do convívio humano é a única forma de erradicar a doença de Chagas;
  • Todos os casos de devem ser imediatamente notificados ao sistema de saúde (portaria SVS 5/2006). Não notificar casos de reativação ou crônicos.
Fonte de consulta:
Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância Epidemiológica. Doenças infecciosas e parasitárias: guia de bolso / Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde. – 6. ed. rev. – Brasília : Ministério da Saúde, 2005. 320 p. – (Série B. Textos Básicos de Saúde).

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